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O coletor de ocasiões.
Ah, se suplícios lancinantes margeassem a borda das hipóteses psicóticas apenas para serem tragadas pela insensatez contumaz de um suposto destino, assim construído na demência humana que estabelece seu desastre particular estaríamos apensas trafegando no contrassenso do período ocasional das urgências humanas que se formam em contínuo contato com o desatino e a arrogância impertinente das ocasiões. Porém, a coisa se torna muito mais complexa neste lugar onde a gordura do corpo se incorpora no calor excepcional para agir como um lubrificante da continuidade existencial que se impõe apesar da ousadia do clima que insiste em coagir o corpo do homem. A verdade, trago em mim tantos momentos, tantas circunstâncias, um oceano de ocasiões, onde naveguei destemidamente para possuir o que hoje me transborda a alma. De fato, sou um colecionador, tenho um sótão imaginário, virtual, cheio de conceitos e determinações, onde abrigo tantas convicções e incertezas quanto as estrelas no céu. O memorial das ações e decisões tomadas, respostas assumidas ao que se apresentou como desafio, pois se o absurdo é a resposta, Albert Camus certamente tem a resposta. Não precisamos de compreensão, apenas e portanto, evitar trafegar nas expectativas e viver para vencer os desafios mesmo que pareçam impossíveis de serem vencidos. Transforme sua paixão em propósito, em vontade inquebrantável de existir, apesar dos revezes, e da maledicência das ocasiões infames que tenha que enfrentar. Lembre-se sempre: o jogo tem de ser jogado, escolha a peça que deseja ser no tabuleiro. Acosse o destino como se fosse um chicote presunçoso que não aceita o trajeto que lhe foi imposto, ao margear o inaceitável, você o coloca dentro de você, se for necessário que se cumpra, então, transfigure-se em desafio, uma ousadia materializada no inconformismo com a realidade. Dentro de sessenta anos eu já mudei tantas vezes minha configuração psicológica para sobreviver que simplesmente encaro cada etapa como uma vida diferente, que somados na trajetória construíram minha realidade hoje. Derrotas, trapaças, traições, perfídia, maledicência, falsidade ocasional e a sistematização da perda de confiança no ser humano, não é fácil. O mundo real machuca, tortura, desafia e impõe pela força de péssimos sortilégios uma rotina desafiadora para qualquer um, os que entendem o cenário seguem em frente, os que não, sucumbem e ficam pelo caminhos da vida.
Se transformam em projetos fracassados, em resíduo ocasional fruto do processo, onde são triturados sonhos que foram incapazes de se sustentar e se adaptar na pauta ocasional que o momento ofereceu, lembrem-se, a paixão, o antídoto contra a negatividade, apaixone-se por si mesmo, ame-se e supere qualquer obstáculo que venha com odor de derrota, devo lembrar que a loquacidade pode ser indesejável nesse plano, ser discreto conta mais e conforme estabeleceu Albert Camus:
“O autor medíocre dessa forma é levado a tudo o que lhe agrada. A grande regra do artista, ao contrário, é esquecer parte de si mesmo em proveito de uma expressão comunicável. Isto não ocorre sem sacrifícios”.
Sim você está no palco, no teatro da vida, portanto, como já citei, apaixone-se por seu desempenho e seja a harmonia determinante do cenário. Existiram com certeza momentos intoleráveis, ocasiões onde a fugacidade das certezas proporcionarão dúvidas e o débito que gerarão e recairão no custo do momento. Analisando o sarcasmo de Chamfort, Camus cita algo útil para nosso tempo:
“O que é efetivamente uma máxima? Simplificando, podemos dizer que é uma equação, em que os signos do primeiro termo se encontram de modo exato no segundo, mas numa novas ordem diferente. Por isso a máxima ideal sempre pode ser invertida. Toda a sua verdade está nela mesma e, assim como uma fórmula algébrica, ela não tem correspondente na experiência. Podemos fazer com ela o que desejarmos, até o esgotamento das combinações possíveis entre os termos do enunciado, sejam eles amor, ódio, interesse ou piedade, liberdade ou justiça. Podemos até, e sempre como na álgebra, extrair de uma de suas combinações um pressentimento da experiência. Mas nada disso é real, porque nela tudo é geral”.
Sejamos indulgentes com essa realidade, ela se ordena entre termos contratuais que insistem em nos reter na plasticidade de seus tempos opacos e submissos ao aprisionamento mental coletivo. Ser indivíduo dentro de tudo isso pode ser exaustivo, muito louco, algumas vezes.
Por isso, por todas essas circunstâncias, devemos adquirir multiplicidade existencial mesmo sendo apenas um. Como um desdobramento quântico que mantém seu entrelaçamento apesar das distâncias. E assim, com tantos laços específicos de uma existência assumidamente fatal, caminharemos no trajeto que nos deram para nos tornarmos matéria para os bardos possuírem uma narrativa para ocasionalmente divulgarem entre interessados em poesia e canto. E assim cá estamos, mais uma vez em fim de ciclo, na fronteira artificial do tempo para instintivamente estarmos com as origens. Somos todos filhos do mar, materialmente a água nos constitui e abriga nossa alma. Este grande ser vivo que proporcionou o corpo que usamos será mais uma vez procurado, não para lazer mas para culto e um ritual de travessia. Ele abusadamente se espalha por todos os cantos, impondo seu gigantismo colossal, poucos entendem isso, esse retorno ocasional as origens. Em associação com tantas outras coisas, adquirimos um corpo para chamar de nosso. Eu, pessoalmente vou cumprindo meu caminho, já deve estar no fim, nunca se sabe. O objetivo parece amplo, por isso coleciono ocasiões, para não me perder de você, destino. Porque enquanto a missão não acaba, minha voz grave irá assim provocar instintos ao pé do ouvido quando o clímax se apresentar na urgência da carne. Um feliz ano novo!
Gerson Ferreira Filho.
ADM 20 – 91992 CRA – RJ.
Citação: A inteligência e o cadafalso. Albert Camus. Editora Record.
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