quarta-feira, 6 de março de 2024

Da estrutura social.

 

                                             Image by Katarzyna Kolm-Jany from Pixabay. 



 Da estrutura social.


Então, neste drama da vida onde sentimentos, sensações e instintos se entrelaçam para definir o perfil da civilização, anomalias constantemente acontecem. Já tem muito tempo Charles-Louis de Secondat, também conhecido como Barão de Montesquieu definiu uma forma civilizada de governança, livre do todo poderoso suserano que detinha o poder total e assim tinha em mãos a vida e o destino de todos. Uma organização equilibrada em três categorias, com delimitações estipuladas constitucionalmente, onde poderes equivalentes praticariam entre si uma fiscalização constante, sem invadir e subjugar outra área de poder. O que Montesquieu sugeriu foi um antídoto contra a tirania, contra aventureiros que de alguma forma tenham em si o desejo de poder absoluto, o que é uma coisa muito presente na civilização. Ele era absolutamente contrário ao absolutismo e criou a tripartição do poder, onde um poder é complementar ao outro e nenhum deles pode se sobrepor aos demais poderes. Não precisa ser muito letrado e versado nesse conhecimento para notar que estamos longe de tal prática hoje. O desejo atroz por controle e por ocupar uma posição faraônica de poder, onde um rei deus detém todo o poder imaginável, flutua na textura da imaginação de muita gente ainda hoje. A vaidade pessoal ao alcançar determinado nível de poder, suplanta a realidade legal e se transforma em algo danoso ao ambiente no qual se aloja tal personalidade. Tribunais que deveriam ser vetustos, habitados por profissionais de ampla e indiscutível sabedoria jurídica, hoje são compostos em maioria por bacharéis sem conteúdo e com a proximidade intelectual de um rábula. Onde se pavoneiam usando uma toga injusta como participantes de um carnaval de Veneza de terceiro mundo. E uma vez testado os limites, e consolidado o avanço sobre os demais poderes, Não há muito o que Fazer, consegue-se assim a morte do real regime democrático, que viverá apenas embalado na palavra democracia, agora corrompida de seu real significado e da sua abrangência penetrante na sociedade. De um regime plural, passamos para a singularidade infame de um pequeno grupo ou talvez, de um só. Vejam, são apenas convenções, método, mas que uma vez colocados em prática e se assim foram aceitos no passado, criaram raízes e se fortaleceram a ponto de não existir hoje mais possibilidade de contestação. A estrutura social adquiriu nova forma, dentro de um desenho diferente de organização, onde setores de apoio ao que acontece passam a obedecer fielmente a nova estrutura que na realidade, não possui legitimidade para existir, não há mais parâmetro legal para estabelecer uma volta ao que nunca deveria ter sido desconsiderado e desrespeitado. Queiram ou não, o texto constitucional definidor de situações políticas ainda existe, mas não parece mais ter importância para ser seguido. A constituição foi lentamente dessacralizada para que se permitisse todo e qualquer evento danoso a sociedade. Que fique definido, homens covardes permitiram isso: por medo, por interesses devassos ou por ignorância. E uma geração de pusilânimes e interesseiros não prospera, não conduz seus pares para um futuro promissor. Neste fim de ciclo civilizatório, estamos no mesmo ponto do desmoronamento do império romano, tomado por bárbaros, perdendo qualidade e poder para uma turba de ignorantes, que prefere o poder de comando ao conhecimento adquirido pelo antigo império. O estrago com a queda do império romano foi tão grande que nem o básico, que é o tratamento e disposição segura de esgoto tinham mais. Algo fundamental para a saúde de cidades e comunidades. O que sobrou depois por muitos anos foi encher o penico e esvaziá-lo pela janela da casa onde moravam. E assim teremos a vota do déspota, a mais simples forma de governo que já existiu. Onde um tirano controla tudo e todos. Como Montesquieu define: “Nos Estados despóticos, a natureza do governo exige uma obediência extrema; e a vontade do príncipe, uma vez conhecida, deve produzir seu efeito tão infalivelmente, quanto uma bola lançada contra outra. Não há moderações, modificações, compromissos, termos, equivalentes, negociações, admoestações; nada de igual ou melhor a propor. O homem é uma criatura que obedece a uma criatura que manda”. Acharam que seria novidade o que se construiu em termos jurídicos no país? O que temos de construção governamental hoje é tão antigo como caminhar sobre duas pernas. Não se trata de evolução, mas sim de um brutal retrocesso.


O importante aqui é entender o que levou a essa decadência social a ponto de instituições sólidas resolverem através de seus membros violar sistematicamente a organização vigente para deformar a realidade política. Através de décadas foi incentivado a perda dos valores tradicionais, o ensino básico, médio e superior foi aviltado e degradado, e claro, os valores do espírito, ou seja, a religião de forma geral foi empobrecida lentamente para dar lugar a um materialismo fútil e sem conteúdo moral. Neste ambiente depauperado de cultura verdadeira, florescem coisas estranhas e desejos ilimitados de controle passam a ter lugar nos sonhos particulares de quem alcança de alguma forma um poder para o qual não se está preparado. O ser humano esvaziado de verdadeira cultura e valores tende a se tornar intolerante e sem abrangência cognitiva para entender que o mundo não gira em torno de si, mas a pluralidade de opinião e pensamento é o que preserva e amplia a qualidade da convivência social. Afinal, civilização é isso, viver em equilíbrio com seus pares de realidade sem oprimi-los ou escravizá-los por caprichos individuais e complexos divinos introjetados, interiorizados em almas em completo desequilíbrio social. Este perfil comportamental costuma se aproveitar de almas que se estruturam na temeridade e na imprudência para criar um universo de comando rude e desproporcional ao que poderia se esperar de um agente governamental numa democracia verdadeira. O empobrecimento mental gera o tirano. E a associação entre estas incapacidades de entendimento da realidade proporcionam um terreno perfeito para qualquer tipo de aberração estruturada na ignorância. Santo Tomás de Aquino já citava: “Além do mais, as virtudes morais são necessárias para que as capacidades inferiores estejam sujeitas à razão”. Viver em sociedade exige aprimoramento e refino comportamental, Através dos milênios e séculos fomos moldando a melhor maneira de conviver e trocar interesses com o próximo, mas o empobrecimento cognitivo e sobretudo moral está direcionando o conjunto social para mais um dos tantos desastres que a história registra. E assim sendo, essa marcha para ao abismo se consolida e inexoravelmente, onde “intelectuais” desnatados se apresentam como solução, dentro de sua incapacidade certificada por títulos e diplomas adquiridos em cursos de especialização empobrecidos propositalmente para gerar justamente isso, a incapacidade pedante, a sensação de superioridade sem lastro, sustentada na vaidade sem tamanho dos absurdos elaborados entre delírios de grandeza. Não há moderação onde o bem não existe. Temos a citação mais uma vez de Santo Tomás de Aquino: “Por isso vulgarmente se diz, que justas são aquelas coisas que são adaptadas de um modo devido. No entanto, sobretudo a moderação, ou o freio, é louvado e tem razão de bem, onde, principalmente impele a paixão, a qual deve refrear a razão, para que se situe no meio termo da virtude”. Sem virtudes morais, sem freio, sem equilíbrio e portanto, temos apenas o caótico ambiente da incompreensão e do abuso que leva a todo arbítrio estipulado por despreparados mentalmente para viver em sociedade de fato. Se vamos mais uma vez colidir contra a obviedade da tragédia anunciada que historicamente se desenvolve na presença de todos não sei, mas há sinais óbvios que este ciclo terminou. Quando desqualificados pelo mundo inteiro assumem o comando de vidas e destinos nunca espere pelo melhor, apenas virá o ajuste necessário que a natureza sempre oferece ao ser vivo, e ela, a natureza é implacável nas suas intervenções de aprimoramento da vida.



Gerson Ferreira Filho.

ADM 20 – 91992 CRA – RJ.


Citações:


Do espírito das leis. Montesquieu Editora Martin Claret.


As virtudes morais. Santo Tomás de Aquino. Editora Ecclesiae.



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