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A soma dos contextos.
Alguns acreditam que por negociação se resolve tudo, outros preferem o confronto, mas a toda circunstância se pede a ação, ou existirá construção de algo que será obstáculo e estorvo no futuro. A negligência e o descaso de hoje será base para uma realidade futura, e ela pode não ser amigável. A tendência é de não existir preocupação com isso, nosso ciclo de vida é muito curto, e muitas vezes as decisões que tomamos não irão nos atingir diretamente no agora, mas gerações futuras pagarão um pesado e caro preço pelo erro estimulado por fata de planejamento ou por ousadia irresponsável que tivemos no passado. A linha do tempo segue, mas as ações permanecem e dão cria. Funciona como o surgimento de uma barreira de corais no mar, na trajetória do tempo, minúsculos organismos vão se acumulando em algum lugar específico até que formem algo enorme e incontornável para a navegação no futuro, uma estrutura agigantada, sólida e viva do que antes parecia ser nada. Assim é o desvio, o mau procedimento, a corrupção. Se você não a controla de forma rígida, abrindo oportunidades com descaso e tolerância, chegará um tempo que ela vai dominar o ambiente de tal forma que sua embarcação não poderá mais navegar no ambiente. Você terá permitido a construção de uma fortaleza no seu perímetro de segurança, e a partir desse momento terá de conviver no desconforto e no risco da permissividade que outrora gerou conforto e satisfação momentânea para disfarçar a irresponsabilidade de alguns. Parece coisa simples, mas não é. Este estilo evasivo quanto ao enfrentamento real de todo problema está impregnado na alma da maioria dos brasileiros, que preferencialmente escolhem o caminho do menor esforço, menor desgaste e assim toleram e admitem conviver sempre com algum nível de desvio que consideram aceitável naquele momento onde ele se apresentou. Estamos de frente para o popular jeitinho brasileiro, uma flexibilidade que passou através do tempo a ser considerada algo bom, alguma coisa que azeita as relações pessoais e políticas. Um progressismo para nós já com perfil arqueológico, que surgiu muito antes das permissividades modernas. O brasileiro é pioneiro nessa construção mental, Onde tudo pode ser ajeitado confortavelmente embora possa ser repugnante e deplorável. Conviver bem com o inaceitável se trata de coisa nossa, que foi distribuída pelo mundo hoje como política global, porque massa de moldar se adapta a qualquer formato. Mas não é assim uma novidade humana, com pão e circo os romanos podiam manipular ânimos e opiniões para que assim pudessem reinar com tranquilidade interna no seu império. Se deve levar em conta que procurar equilíbrio com o que está errado, pode gerar relações inusitadas. Claro, nesse ambiente, provavelmente quase todo mundo já teve de fazer algo errado para sobreviver mais um dia. Uma Bandalha não permitida em alguma via sem retornos e acessos aceitáveis e necessários, um pagamento de arrego, pois se não o fizesse não teria prosseguimento em seu atendimento e por ai vai. Isto aqui é Brasil, a terra da caixinha, obrigado! Daquele incentivo por fora para que o procedimento, seja lá qual for assim flua no devido tempo normal, mesmo não existindo nenhuma regra que o defina como obrigação. Aqui é normal, praticamente inevitável! Some tudo isso no contexto processual da nossa realidade, mas ainda assim é possível manter uma boa compostura no restante, nas coisas mais graves e decisivas. Não se deve criar intimidade com o erro entrando em negociação equilibrada com ele. Isto gera afinidade, e afinidade é tudo na relação. Desse ponto, a estar debaixo de lençóis na cama em intenso coito com a corrupção não tem muita distância. O dinheiro passa a não ter carimbo, a procedência de algum produto não importa mais, não se faz mais questão de ver, ouvir e tomar conhecimento das performances heterodoxas em relação a lei de fato. A parcimônia com o escândalo não vai torná-lo austero, você será apenas mais um sem-vergonha. E assim sendo, para qualquer um que esteja no espectro da legalidade e viva sob bom procedimento irá concordar que os mais ousados na prática da corrupção e atividades agregadas devieram sofrer punição exemplar para que assim sirvam de parâmetro de controle sobre os estimulados a praticar crime, nada melhor do que uma boa punição para servir de incentivo reverso na vontade de quem planeja delinquir. Eu sei, os modernosos progressistas ao ler isso ficariam com os pelos eriçados, eles amam o criminoso. Onde já se viu punir um criminoso não é? Uma licenciosidade leva a outra e então, temos uma anomalia generalizada subsidiada por políticas esquizofrênicas de inclusão e controle social. Sejam bem vindos ao hospício! Mas ainda pode existir uma opção de correção, poucos muito poucos ainda raciocinam e tentam demonstrar que existe um rumo a ser seguido, mas o caminho será árduo, muito difícil, porque hoje o certo se considera errado.
Existe literatura jurídica a respeito do que fazer realmente para obter uma gradativa correção de rumo, o confisco alargado, uma metodologia para punir quem se envolve com o crime e a corrupção. Este método seria o ato jurídico de provocar uma perda quase total no patrimônio do criminoso. Fazer com que quem viveu e tirou vantagem de ilegalidades sofra com a perda de praticamente tudo que amealhou com a atividade ilegal. O livro Segurança e crime organizado cita: “A natureza jurídica que se deve dar ao confisco alargado, acompanhando a melhor doutrina e o direito comparado, é no sentido de sua natureza civil acessória à condenação criminal. A questão é complexa, porém, é salutar que seja interpretada em seu contexto civil para maior eficácia do instituto do confisco alargado,..”. Então, propostas existem o que falta é atitude e boa vontade. Não existe ausência de boas opções para que venhamos a ter um futuro melhor, mas fica evidente que os beneficiários das condições atuais não vão gostar de tais alterações na estrutura da realidade de onde essa gente tira o alimento cognitivo de sua percepção corrompida de mundo. Edmund Burke citado por Roger Scruton define: “Há um acúmulo de razão na sociedade, que questionamos ou rejeitamos por nossa conta e risco. A razão consequentemente se mostra naquilo que não racionalizamos e talvez não consigamos racionalizar – e é o que vemos em nossas tradições, incluindo as que contêm sacrifícios em seu âmago, como honra militar, a dedicação à família e a devoção aos deuses”. Eis a questão, todos acreditam ter razão e ninguém tem razão. E com isso evaporam os valores familiares, os de honra e até a crença do divino, em algo superior que zela por nós. O principal problema a ser resolvido está em fazer com que os que se beneficiam do caos entendam que no fim todos morrem, até eles. A degeneração social vai se acentuando através do tempo, e se algo não surgir para efeito de correção, os que se consideram a salvo e privilegiados hoje poderão ter uma surpresa bem desagradável no futuro. Porque o arbítrio, em algum momento pode mudar de mãos. Não são profecias de Cassandra, mas apenas a organização social que sempre está sujeita ao imponderável, por mais controlada que pareça ser. A prudência continua a ser uma boa opção para se resguardar dos revezes da vida.
Gerson Ferreira Filho.
Citação:
Segurança e crime organizado. Arthur Weintraub. Vide Editorial.
Conservadorismo, um convite à grande tradição. Roger Scruton. Record Editora.
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